Invocação do Mal 2 – Crítica


Após o absoluto sucesso de Invocação do Mal e de seu derivado, Annabelle, a Warner não demoraria a continuar a expandir tal universo. O estúdio, ao lado do jovem, porém talentosíssimo diretor, James Wan, exploram, neste segundo longa, mais um dos casos registrados pelo casal americano Ed e Lorraine Warren.

Ao lado da comédia, o gênero Terror é o mais problemático dos cinemas. Com a recente explosão dos found footages com momentos de jumpscares, cada vez mais filmes preguiçosos do gênero surgem. Os orçamentos cada vez mais altos contribuem para que os produtores e diretores caiam no pecado de preferir a utilização dos recursos digitais – que normalmente é plástico e, de fato, desengraçado, artificial – e deixam de lado um bom engajamento de cenas, boas atuações, bons diálogos e, principalmente, deixam de lado a imersão ao terror. Quase nunca há uma contextualização aterrorizante.

Não confunda o terror clássico com o terror jumpscare. O clássico coloca o espectador por completo em um clima de tensão e de grande desconforto físico e, principalmente, emocional. No clássico O Iluminado, Kubrick – com todas as limitações da época – utilizava de um ambiente desproporcional, claustrofóbico e totalmente sem sentido para criar um desconforto desmesurado à quem o assiste. Isso, misturado a atuações memoráveis e um roteiro fascinante, permitiu com que o diretor tenha feito a maior obra do cinema de terror.

Porém, em 2013, Wan mostrou existir qualidade no questionável jumpscare. Invocação do Mal conseguiu misturar elementos de grandes clássicos, com uma direção invejável, atuações ótimas, bons momentos de susto e elementos do clássico horror – tudo isso fazendo do filme um dos melhores do gênero da última década, repetindo vários elementos de seu anterior filme de terror, Sobrenatural.

Invocação do Mal 2 adapta aos cinemas um dos mais comentados casos do sobrenaturalismo da Inglaterra: O Poltergeist de Enfield. No filme, ambientado nos anos 70, Ed (Patrick Wilson) e Lorraine Warren (Vera Farmiga) – velhos conhecidos na franquia – são acionados não para investigar, mas ajudar a reunir provas para a igreja católica de que uma família em Enfield, na Inglaterra, é perturbada por algum tipo de espírito – seja ele humano ou não. Os atos do filme são constantemente comparados com os acontecimentos de outro famoso caso dos Warren, o da casa de Amityville – que já teve várias adaptações para o cinema e documentários. A família é composta por uma mãe – Peggy Hodgson (Frances O'Connor) – e quatro filhos, o qual tem como destaque – e principal vítima da suposta assombração – Janet (Madison Wolfe).

O diretor tem como uma de suas maiores qualidades apresentar ao público uma boa caracterização de época. Assim como no anterior, Wan não peca em deixar explícito e em brincar com esteriótipos dos anos 70. É perceptível o seu carinho com este detalhe no começo do filme, momento o qual uma garota de apenas 11 anos aparece fumando um cigarro escondido com Janet – clássico do período em que o filme é ambientado. Mas a característica detalhista do diretor vai além: todos os cenários – principalmente a residência dos Hodgson – são assustadoramente iguais aos originais, sem contar nas características físicas de vários personagens, como, por exemplo, o investigador paranormal Maurice Grosse (Simon McBurney).

Todo o detalhismo de James Wan cria aquela ambientação amedrontadora citada anteriormente. O desconforto e a estranheza no ar são tendenciosamente colocados de forma a absorver até mesmo ao mais cético alvo. A paleta de cores mais escuras dentro e nas proximidades da residência, os cantos, paredes e móveis desgastados reforçam o sentimento de presença e vigilância. É possível notar o contraste de cores quando a casa dos Warren é apresentada: é o extremo oposto dos Hodgson. As características de determinados cenários são bastante insinuantes à outros filmes do gênero terror, como numa cena no corredor dos Warren, que é uma bela homenagem ao já citado O Iluminado. Além deste, alguns momentos lembram outros clássicos, como numa cena em que Ed passa por uma região inundada, muito semelhante com o do filme Poltergeist, ou quando a Janet fica encostada na televisão; A própria casa e o ambiente dentro dela lembram bastante a de Cole Sear em O Sexto Sentido; A inocência misturada ao medo dos personagens infantis lembram muito ao de The Babadook (2014) – inclusive o brinquedo chamado "Crooked Man" do garoto mais velho é bastante semelhante ao monstro do filme de 2014.

Por ser tão detalhista, outra característica fortíssima do diretor é movimentar muito a câmera pelo cenário. No filme isso fica bastante evidente em um take o qual a câmera entra de fora para dentro do cenário: entra pela janela e passeia pelos corredores da residência, com intuito de deixar o espectador com um bom senso de ambientação e posicionamentos da casa. Mesmo em cenários fechados, a câmera costuma andar bastante – o que favorece aos detalhes pelo diretor implantados. Entretanto, apesar de muito movimento, a filmagem não é tão cansativa como a resultante da famigerada "câmera na mão". Outra característica de filmagem presente no filme é na apresentação do monstro. Os filmes anteriores do Wan utilizavam disto: sugeriam o monstro, e quando o público já aceita que não terá um vislumbre da entidade além de vultos, ele dá um close na face assustadora da criatura em questão. A sugestão e depois a revelação são extremamente complementares: Ele deixa o medo florescer para depois cole-lo. Ele utiliza de uma vasta seleção de recursos de filmagens para instigar, como, além das já citadas anteriormente, a mudança de foco em um mesmo enquadramento para trabalhar a psique do espectador. Há várias tomadas panorâmicas que se unem em momentos de tensão, por aí vai.

Auxiliar e fundamental nos momentos de apreensão – e são vários –, a trilha sonora cai como uma luva. Nos momentos mais leves, há uma vasta diversidade musical e absolutamente todas de qualidade. As faixas variam desde Elvis Presley até Bee Gees. A trilha própria do filme é imponente, intimidante, sempre utilizada de forma pontual e muito bem medida – sem se deixar cair no escândalo ou se destoar da cena a qual a música é atribuida.

Como já dito, o terror necessita de boas atuações, e isso é o que não falta neste filme. Todos os personagens são muito bem interpretados, com um grande destaque para Madison Wolfe. A jovem atriz fez uma papel angustiante e perturbador com uma maestria e uma simplicidade a nível de gente grande. Wolfe é uma atriz a se ficar de olho. Patrick Wilson e Vera Farmiga estão com uma química maravilhosa aqui e juntos fazem papéis ótimos, que fazem com quem assiste se importe  – o que é fundamental no gênero. Contudo, Madison entregou uma atuação tão elegante que acaba ofuscando aos outros atores do filme – atores de peso.

No entanto, o filme acaba se perdendo no ritmo. Há uma grande demora para que as subtramas se conectem e, principalmente, as famílias (Warren e Hodgson), o que faz com que o filme seja muito prolixo e cansativo em alguns momentos. Talvez o excesso de subtramas – o que já aconteceu no filme anterior – faz com que isso aconteça. Aqui é nítida a vontade de se criar uma grande franquia em volta dos Warren: várias criaturas são jogadas na trama para que instigue o espectador e faça com que eles tenham curiosidade – o que dá liberdade ao estúdio a fazer filmes derivados. A finalização do último ato é um tanto quanto vaga: é criada toda uma trama para que no final haja um combate épico, o que deixa o espectador na inércia de ver algo substancial. O filme mantém a qualidade, porém não inova em relação ao anterior.

Invocação do Mal 2 é um filme grandioso, com bons momentos de horror, sustos, ambientação inquestionavelmente esplêndida, atuações memoráveis, direção de arte aterrorizante, trilha sonora pontual, direção cuidadosa e dinâmica, roteiro de fato bom, porém com vários excessos e alguns deslizes, e, sem dúvidas, um ótimo exercício do gênero. Tem tudo o que um blockbuster de terror deveria ter e vai além. Indubitavelmente um dos melhores da categoria no ano e indispensável para os fãs do diretor, de terror e dos Warren. Não será lembrado como um clássico no futuro, mas não deixa de ser uma grande experiência.

  Nota do avaliador:

Já assistiu ao filme? Se sim, comente o que achou! Invocação do Mal 2 está em cartaz nos cinemas brasileiros.
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